“Diz-me o que fazes quando estás livre para fazer o que queres, e eu te direi que tipo de pessoa és”
(Charles Brightbill, 1960)
Podemos subir e descer uma escada, da mesma forma, uma ponte pode ser atravessada para lá e para cá. Em ambos os casos, fruto do olhar, o caminho já não se afigura como uma surpresa total. Fiquei a pensar. Percebi que nesta lógica uma mão agarra e é agarrada, isto é, uma mão dá-se e recebe. Esta reflexão cuja oportunidade me foi dada a ter, levou-me à importância da comunicação, porque “quando comunico, comunico-me sempre primeiro – dita do antigo.” (Ilharco, 2020 p. 1). Para agarrar uma mão e assim criar uma ponte importa acautelar que “o modo como se diz o que se diz, geralmente, tem mais influência do que aquilo se diz.” (Ilharco, 2020 p.1). Por exemplo, se precisamos de conversar perguntamos a um amigo se quer tomar um café. Percebendo o modo e o tom com que o dizemos, o amigo aceita prontamente tomar um café. Ao chegar ao sítio combinado pede uma água sem gás (o café “perdeu-se” …). O amigo percebeu que queríamos conversar e nós percebemos que o amigo nos queria ouvir porque na comunicação há simultaneamente mensagem e relação. Sendo a relação aquilo que mais marca e influencia uma boa comunicação. O episódio do café acontece em tantos domínios da nossa vida. Estou desconfiada que é assim que se estendem mãos e se criam pontes. Reciprocidade.
Nesta lógica, o Lazer faz muitíssimo sentido como ferramenta para unir mãos e construir pontes porque nos mostra que o verdadeiro valor de cada individuo está escondido ou guardado noutros lugares…sem idade… porque ao longo da vida as pessoas movem-se por interesses. Pese embora um dos aspetos da sociedade ocidental que contribui para uma imagem negativa dos adultos mais velhas seja o rótulo da improdutividade associado ao afastamento do mercado de trabalho. Mas, Bruni (2010) refere que o problema não é esse afastamento, o verdadeiro problema é os indivíduos saírem de uma rede de reciprocidade que leva a aguçar a arte de ser úteis uns aos outros (Bruni, 2010). Mais do que uma questão de equilíbrio entre trabalho e tempo livre, a questão aqui é como usar esse tempo livre, assim há uma constante ponderação e articulação entre o tempo de trabalho e o tempo livre.
Pode definir-se o Lazer como uma atividade praticada de livre vontade e praticada no tempo livre. As questões associadas à gestão do tempo são relevantes, nomeadamente a procura de tempo livre para a prática de atividades agradáveis. Este poderá ser o primeiro passo na procura de uma boa qualidade de vida. Depois surge a questão de como usar esse tempo livre. Sendo relevante salvaguardar que o tempo livre das pessoas idosas tende a não ser valorizado. Na verdade, ninguém tem o tempo todo livre. Ninguém. Independentemente da idade. O respeito pelo tempo livre e não livre de cada individuo é essencial.
O Lazer é Sério quando tem objetivos, é aquela atividade realizada sistematicamente encarada como um hobby e realizada com espírito amador ou voluntário. É uma atividade particularmente significativa e interessante para o praticante, em que os indivíduos evoluem e progridem articulando os seus recursos e competências, os seus conhecimentos e a experiência, e, daqui retiram uma realização relevante (Stebbins, 1992).
Convido o leitor a imaginar o Lazer como uma ferramenta que permite ao seu utilizador: i) agarrar uma atividade relevante; ii) aumentar as competências, recursos, conhecimentos e a experiência pessoal; iii) atingir objetivos cada vez mais sofisticados; iv) ter uma experiência ótima e, v) sentir uma realização profunda. É caso para dizer que o Lazer pode ser um caso muito sério. Através da prática de atividades de Lazer há uma mão que antes de se estender já se deu a conhecer, há uma ponte assente nos interesses comuns que se pode estabelecer com sentido de ida e volta. Os interesses partilham-se. Reciprocidade. Eu diria reciprocidade sem idade à vista. De acordo com o referido autor, as atividades de Lazer Sério implicam perseverar e querer evoluir. Curiosamente, atitudes essenciais tanto para chegar à mão na mão como para construir pontes.
A prática de atividades de lazer contribui positivamente para a saúde porque produz mecanismos capazes de enfrentar os eventos stressantes da vida. Esta contribuição é mediada por dois fatores: 1) companheirismo, amizades e perceção de suporte social, e 2) uma disposição de autodeterminação, que permite um efeito de amortecimento do stresse, e revela benefícios para a saúde (Coleman & Isso-Ahola, 1992; 2018).
Mão na mão com confiança e pontes seguras. Ao nível da segurança a participação em atividades de lazer é relevante porque os indivíduos integram uma rede relacional onde será mais fácil identificar e atuar perante fatores de risco (d’Araújo & Fonseca, 2019). Por outro lado, a interação cara-a-cara (mão na mão) permite que coletivamente seja possível desconstruir preconceitos e estereótipos sociais graves acerca do envelhecimento e da velhice contribuindo assim para a construção de (pontes) positivas e apreciativas. Pontes que podem ser atravessadas para lá e para cá, sempre com a mão na mão. Sempre em Relação, com uma boa comunicação. Reciprocidade.
Bruni, L. (2010). A ferida do outro. Abrigada: Cidade Nova.
d’Araújo, M. A., & Fonseca, J. R. S. (2019). Serious Leisure as a Strategy to Reduce Loneliness and Social Isolation: A Preventive Response to Elderly Women Abuse. In Violence Against Older Women, Volume II (pp. 143-164). Palgrave Macmillan, Cham.
Ilharco, F. (2020). Não Se Pode Não Comunicar. Medicina Interna.
Coleman, D., & Iso-Ahola, S. E. (1993). Leisure and health: The role of social support and self-determination. Journal of leisure research, 25(2), 111-128. Stebbins, R. A. (1992). Amateurs, professionals, and serious leisure. Montreal, QU:McGill-Queen’s University Press.