Out 10, 2023 | Colina da Moria, Desafios

Carmelita Descalço

Navegar é preciso!

Partilhar:
Pin Share

Navegar é preciso; viver não é preciso; o que é necessário é criar.

Navegar, onde? Aqui, onde a terra se acaba e o mar começa. De que mar falamos? Do mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim? Do mar da alma e do sentido da vida dos portugueses? O mar é um apelo que não cessa de ecoar no ânimo de cada português…À vista do oceano, os portugueses são levados a reflectir sobre os imensos espaços da alma e sobre o sentido da vida no mundo. Do oceano filho do céu e filho da terra? Da imensa vastidão de água, o oceano que recorda as origens da vida? Do oceano da história da Europa e do Ocidente?

No oceano da história, estamos a navegar num momento tempestuoso e sente-se a falta de rotas corajosas de paz. Para onde navegas, se não ofereces percursos de paz, vias inovadoras para acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo? E ainda, alargando o campo: Que rota estás a seguir, Ocidente?

Para onde estamos a navegar e que rota estamos a seguir em Portugal? Navegar é pescar no mar da pequena terra de Portugal, onde nascemos, e em toda a terra do mundo, onde morremos. Navegar é desafiar as ondas gigantes, fazer-se ao largo, lançar as redes no mar da evangelização e da missão.

Por onde navegamos? Por mares nunca dantes navegados, por caminhos novos nunca sabidos.

A vida é o teu navio, e não a tua morada! Quando era pequenina, estas palavras davam-me coragem; a imagem do navio encanta-me ainda a alma e ajuda-me a suportar o exílio. “A vida é como o barco que corta as ondas agitadas, sem deixar atrás de si nenhum sinal da sua rápida passagem”. Quando penso nestas coisas, a minha alma mergulha no infinito; parece-me estar já a chegar à margem eterna; parece-me receber já os abraços de Jesus. Julgo ver a minha Mãe do Céu vir ao meu encontro com o Papá, a Mamã, os quatro anjinhos. Parece-me gozar, enfim, para sempre, da verdadeira, da eterna vida em família.

Quando te sentas sobre o mar, estás numa encruzilhada. Dum lado a vida, do outro a morte. Lá não há outras saídas. Encontramo-nos perante uma encruzilhada de civilização.

Navegamos para o mar da morte?

«Para onde navegais, Europa e Ocidente, com o descarte dos idosos, os muros de arame farpado, as mortandades no mar e os berços vazios? Para onde navegais? Para onde ides se, perante o tormento de viver, vos limitais a oferecer remédios rápidos e errados como o fácil acesso à morte, solução cómoda que parece doce, mas na realidade é mais amarga que as águas do mar? Penso em tantas leis sofisticadas sobre a eutanásia!».

Navegamos para o oceano da vida?

Para se chegar ao infinito, e julgo que se pode lá chegar, é preciso termos um porto, um só, firme, e partir dali para Indefinido. Podemos chegar ao infinito, se mergulharmos no oceano sem limites do Amor infinito, se cavalgarmos as ondas do amor, as ondas da caridade, sendo surfistas do amor, chegaremos à margem eterna, ao face-a-face eterno.

É necessário criar: Navegar é criar: Trabalhemos com criatividade para construirmos juntos o ambiente, o futuro, a fraternidade. Criar o ambiente: O oceano lembra-nos que a existência humana é chamada a viver de harmonia com um ambiente maior do que nós. Criar o futuro: O futuro são os jovens. É preciso retomar o diálogo ente jovens e idosos. Criar a fraternidade: Somos todos chamados a cultivar o sentido da comunidade, começando por ir ter com quem vive ao nosso lado. Navegar é buscar: O que dá verdadeiro sentido ao encontro é a busca; e é preciso andar muito, para se alcançar o que está perto.

Viver não é preciso. Não é preciso viver no orgulho, no egoísmo, no isolamento, na vaidade, na angústia, no desespero e na morte. É preciso dar esperança ao mundo em que vivemos e a este magnífico país em que habitamos.

Navegar é necessário. É necessário permitir que a Palavra do Senhor tome na mão o leme… é necessário despertar a ânsia pelo Evangelho. Jesus caminhou sobre as ondas do mar e mandou que Pedro caminhasse sobra as águas para ir ter com Ele.

O Mestre quer que saiam de novo para o mar a fim de pescar. A interpelação que o Senhor dirige hoje à Igreja é esta: «Queres descer do barco e afundar na desilusão, ou fazer-Me subir permitindo que seja mais uma vez a novidade da minha Palavra a tomar na mão o leme? Eis o que nos pede o Senhor: despertar a ânsia pelo Evangelho. Somos chamados a lançar de novo as redes e a abraçar o mundo com a esperança do Evangelho. Este é o tempo da graça que o Senhor nos concede para nos aventurarmos no mar da evangelização e da missão… Apenas na adoração, só diante do Senhor, é que recuperamos o gosto e a paixão pela evangelização. Somos chamados a mergulhar as nossas redes no tempo em que vivemos, a dialogar com todos, a tornar compreensível o Evangelho, mesmo que para isso tenhamos de correr o risco dalguma tempestade. Como os jovens que aqui vêm de todo o mundo para desafiar as ondas gigantes, façamo-nos ao largo também nós sem medo. Sim! Não temamos enfrentar o mar alto, porque no meio da tempestade e dos ventos contrários, Jesus vem ao nosso encontro e diz: Coragem, sou Eu, não temais! Na barca da Igreja, deve haver lugar para todos: todos os baptizados são chamados a subir para ela e lançar as redes, empenhando-se pessoalmente no anúncio do Evangelho.

Navegar é tornar-se pescadores de homens. Não tenhais medo. É necessário navegar nas «ondas da confiança e do amor»: Lançou-me a todo o pano sobre as ondas da confiança e do amor, que me atraíam com tanta força, mas sobre as quais não me atrevia a navegar. Mas na barca de Pedro onde Jesus toma na mão o leme e envia a Igreja a abraçar o mundo com a esperança do Evangelho: Encontrara no meu quarto um pequeno navio, que levava dentro o pequeno Jesus, a dormir, com uma pequena bola ao pé d’Ele. Na vela branca, a Celina escrevera estas palavras: Eu durmo, mas o meu coração vigia; e no barco, esta única palavra: Abandono! Navegar é viver a Palavra, lançando as redes no mar alto do mundo e criar rotas corajosas de paz. Fazei, Senhor, que se acalme este mar. Não ande sempre em tamanha tempestade a nave da Igreja! E salvai-nos, Senhor meu, que perecemos! Deus salve a Europa e o mundo da tragédia dos naufrágios! Deus abençoe Portugal!

Manuel Reis

Carmelita Descalço

Partilhar:

Artigos

Relacionados