Num tempo de excesso de luz e de omnipresença dos écrans quem ainda sabe contar uma história? Ou melhor, quem neste tempo de vertigem tem tempo para escutar histórias? E se não as aprendem quem, no futuro, contará o encontro dos Magos com a família de Nazaré?
Na lógica dos contrastes, valorizamos a luz quando se faz noite e se torna difícil ver as veredas do caminho. Aqueles que caminham, bem sabem que essa estrela aponta “O Caminho”. Ainda que lá ao longe, ainda que escondida pelas nuvens da noite, ela lá permanece.
A noite tem um sentido simbólico profundo. Era à noite que Jesus se retirava para rezar com o Pai. A noite é um lugar de encontros! Foi à noite que Jesus lutou contra os medos e as dúvidas que O assaltaram no Getsémani. A noite é um lugar de purificação!
Hoje não nos podemos queixar da falta de luz, antes pelo contrário… vivemos rodeados de luzes e luzinhas. A agitação do dia-dia tira-nos espaço para o silêncio, e talvez seja também por isso que somos cada vez menos pacientes perante o escuro da noite. É algo progressivo e que se tem intensificado a olhos vistos. Deixamos de ter paciência para as birras dos nossos filhos e por isso pomos o telemóvel à sua frente para que comam. Todo aquele teatro de canções e gestos em torno da refeição dá lugar a um momento meramente fisiológico (porque todos temos de comer!). O telemóvel torna-se assim a presença constante em todos os momentos das crianças desde que nascem. Resultado? Temos crianças com 5, 6 anos que não sabem contar uma história, que perdem aquele espanto natural com o mundo que as rodeia e que têm lacunas evidentes na sua capacidade de relação interpessoal.
Há dias surgiu um vídeo nas redes sociais, com milhares de pessoas a filmar o fogo de artificio sobre o Arco do Triunfo em França, na passagem do ano. Vemos tantos ecrãs, quanto cabeças. Não sendo especialista no tema, não posso deixar de pensar na influência que tem (e terá ainda mais no futuro) na forma como nos relacionamos com os outros e com o mundo que nos rodeia. É interessante pensar este tema mesmo do ponto de vista da religião e da pastoral. Havendo dificuldade em pensar o imaginário, em fazer uma composição sobre algo que pensamos ou fizemos, como se conseguirá compreender ou interpretar a mensagem subjacente a tantas das parábolas de Jesus.
«Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer?»
Aqueles que caminham vieram de longe e seguiram a estrela ao encontro do Menino. Ali O adoraram e Lhe ofereceram os seus presentes. De regresso à sua terra, seguiram por «outro caminho». O encontro com a família de Nazaré mudou as suas vidas. É uma experiência radical que transforma as suas vidas. Aqueles que partem já não são os mesmos que chegaram, levam a boa-notícia do nascimento do Deus menino e a experiência de O terem tocado.
Aqueles reis (imaginamos poderosos, cheios de toda a realeza) vindos lá do oriente, vieram ao encontro d’Aquele que se fez pequenino, num curral. Aquele Deus grande e poderoso revelou-se num menino pobre e despido de qualquer poder. Esta experiência do mistério de amor transforma a vida.
A estrela que os reis magos seguiram aponta para um lugar específico e abre-lhes a possibilidade do encontro com o menino Jesus, Maria e José. A estrela é tanto mais importante, quanto mais desejarmos e procurarmos quem ela indica. Assim também na nossa vida! Tal como os reis magos, caminhamos na fé à procura deste Jesus que se encontra nos lugares mais inesperados. Não podemos parar porque no caminho de Deus não se pode parar e quem não avança recua. Procuremos os sinais da sua presença na nossa história, nas vivências do nosso quotidiano, nos companheiros de viagem que se cruzam connosco, pois é aí que Ele se vai revelando aos olhos do nosso coração.
Que presentes lhe poderemos oferecer? Na falta de ouro, incenso ou mirra, talvez lhe possamos oferecer: a nossa humildade, ao sabermos deixar de lado as nossas grandezas; o nosso respeito, ao sermos para os outros aquilo que queremos que eles sejam para nós; o nosso altruísmo, a estarmos sempre para o outro; a nossa gratidão em aceitar o que a vida nos dá; o nosso compromisso de nunca O parar de procurar.