A metáfora do caminho associada à minha vida cristã, diz-me muito. É uma simbologia cheia de sentido! Como cristãos, somos um povo a caminho, em peregrinação. «A história do povo de Deus – a história da Igreja – está sempre marcada por partidas, deslocações, mudanças»[1]. Tal como na Galileia há dois mil anos, continuamos a ser desafiados a pôr os pés ao caminho para seguir Jesus. «Cristo obriga-nos a segui-lo, a buscar a verdade e a nunca afrouxar nela»[2]. Por outras palavras, somos chamados à santidade no quotidiano da nossa vida «cada um pelo seu caminho»[3].
Este chamamento constitui a missão central do cristão nos dias de hoje. É uma opção radical porque envolve todas as circunstâncias da nossa vida: interior, familiar, profissional e social. Perante a multiplicidade de recompensas e soluções que o mundo nos oferece, somos desafiados a manter a mesma direção: a nossa meta é Cristo (Fl 3, 8-16).
Caminhemos juntos ao Seu encontro!
Um sentido para o caminho
Hoje, como não se tem claro qual o caminho a percorrer, não se encontram sinais significativos que apontam o sentido, pois não os identificamos como tais. Vemos assim caminhantes errantes, porque perdidos, sempre à procura de algo que não encontram. Andam numa corrida desenfreada, mas acabam por num sair do lugar onde se encontram.
Quando se encontra um sentido para a vida, o caminho (a vida) torna-se mais nítido porque começamos a identificar os sinais, por vezes entre os arbustos meios escondidos ou já gastos… O caminho não se torna mais fácil, apenas começa a fazer sentido. Já sabemos para onde vamos e isso liberta-nos daquela amargura de quem anda perdido. Já temos um sentido para o nosso caminhar, ganhamos força e resiliência para enfrentar as subidas mais íngremes ou as levadas mais perigosas porque sabemos para onde vamos. Quando fazemos um percurso pedestre e andamos muito tempo sem ver um sinal da marcação, ficámos alerta e à sua procura. Se não vemos o sinal é porque, muito provavelmente, não estamos no caminho certo e algures lá atrás, naquela intersecção que passámos, não tomámos a direção correta.
O mesmo sucede na nossa vida, quando paramos para refletir sobre o que fizemos e as atitudes que tivemos! É também nesses momentos que tomamos consciência de que não caminhamos sozinhos, mas como igreja peregrina!
«Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos» (Mt 28, 20). Esta é a grande certeza de quem se dispõe a caminhar e a razão da nossa esperança! «Jesus encontra-se connosco onde nós estamos, abraça-nos e aperta-nos contra si quando a realidade se torna dura, ajudando-nos a encontrar o caminho a seguir»[4].
Transformar o mundo a partir de dentro
A evolução da modernidade culminou num mundo onde Deus parece já não ter lugar ou já não é relevante. Procura-se remeter a fé cristã para uma realidade pessoal, íntima da pessoa que nada tem que ver com a política, com a sociedade, com a economia. Neste processo de secularização a Igreja foi perdendo a sua voz.
O “ser-se cristão” não se resume à relação pessoal com Deus! Ser-se cristão é ser testemunha de uma Verdade maior do que nós, é seguir os passos de Cristo no quotidiano da nossa vida. É um desafio tremendo para cada um de nós e ao qual não podemos fugir, sob pena de vivermos pela metade.
É neste mundo e no nosso contexto particular em que hoje somos desafiados a ser «sal da terra» e a «luz do mundo» (Mt 5, 14).
Como posso ser sinal de mudança para as pessoas que se cruzam comigo? Como posso ajudar a transformar o mundo de hoje à luz dos ensinamentos de Jesus? Com estas questões lanço o convite a refletirmos sobre o nosso papel, enquanto cristãos, no mundo de hoje. Acredito que o processo de transformação do mundo parte de um movimento de dentro para fora, através do exemplo de vida dos cristãos no seio da sociedade. As questões fraturantes que vão surgindo exigem cristãos cada vez mais informados, esclarecidos e convictos. Na oração e na formação encontramos duas ferramentas complementares, são o nosso bálsamo e cajado para o caminho.
Nas próximas duas partilhas que oportunamente farei neste espaço, vamos procurar, fazer um breve resumo de alguns movimentos ideológicos e de algumas questões fraturantes da sociedade atual. (Só com um bom diagnóstico poderemos curar as feridas deste mundo!). Posteriormente, vamos apontar alguns caminhos possíveis para podermos transformar o mundo à nossa volta a partir de dentro.
Entregamos nas mãos de Deus este caminho a que nos propomos. Rezamos a Jesus para que derrame sobre nós o seu Espírito Santo e nos conceda o dom da Ciência, da Sabedoria e do Entendimento.
[1] Papa Francisco, Discurso à Curia Romana de 21 de dezembro 2019.
[2] Halik, Tomas, O meu Deus é um Deus ferido, Paulinas, 2016, p. 182.
[3] Constituição Dogmática Lumen Gentium 11.
[4] Leonard, Richard, Onde diabo está deus? Paulinas, 2015, p. 107.