Carmelo de Coimbra

Não tenhais medo!

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«Não tenhais medo!».  Tais foram as primeiras palavras dirigidas por Nossa Senhora aos três pequenos pastorinhos, a 13 de maio de 1917. Não temer as manifestações de Deus significa ter fé e confiar total e inteiramente n’Ele, no Seu Amor, na Sua grandeza e na Sua proteção.

É interessante notar que estas foram também as palavras do Anjo ao saudar a Virgem: «Não temas, Maria!» (Lc 1,30); ditas também a José, em sonho: «José, não temas receber Maria, tua esposa» (Mt 1,20); foram ainda dirigidas aos pastores, na noite do nascimento de Jesus: «Não temais, anuncio-vos uma grande alegria!» (Lc 2,10) e, muitas vezes, dirigidas aos Apóstolos e discípulos de Jesus, durante a Sua vida terrena e depois da Sua ressurreição: «Não temais, sou Eu!» (Mt 14,27).

Diante de Deus não devemos ter medo, mesmo que, muitas vezes, não entendamos ou nos sintamos perturbados, inquietos, sem certezas… Ter medo pode significar falta de fé e confiança em Deus. Diziam os antigos que «o medo é o pai dos deuses». O medo, sempre que infundado, suscita em nós a imaginação irreal do perigo que pode nunca existir ou acontecer, torna-nos escravos do que nos pode fazer mal, do que receamos que aconteça no futuro, quando, na verdade, Deus nos pede que confiemos no Seu Amor, na Sua ação e no Seu poder libertador e salvador.

Atualmente a nossa vida confessa a fragilidade da fé, porque vivemos entre muitos medos: o medo de perder a estima e o prestígio; o medo do que os outros vão pensar ou de nós dizer; o medo de perder a saúde ou a vida; o medo da guerra e das suas consequências, o medo do silêncio da oração e do encontro com Deus… Os medos de hoje podem ser, ou não, iguais aos medos dos discípulos de Jesus, ou até mesmo aos medos dos pastorinhos de Fátima; Jesus continua, porém, a dizer-nos nas várias circunstâncias da nossa vida: «Não tenhais medo!».

A Irmã Lúcia aprendeu, muito cedo, a não ter medo das manifestações de Deus, do desconhecido, do incompreensível aos olhos humanos. As três crianças, na Cova da Iria, sentiram medo dos relâmpagos, porém, ao verem a linda e serena Senhora, que lhes falava de cima de uma pequena azinheira, os seus corações serenaram e ficaram extasiados! 

A partir daquele dia 13 de maio, os pastorinhos nunca mais tiveram medo de nada: e assim, sem medo, enfrentaram a família incrédula ao que eles diziam; o povo que se amotinava curioso à sua volta; os intermináveis e exaustivos interrogatórios; o Administrador que os meteu na cadeia e os ameaçou com a caldeira de azeite a ferver; e, sempre sem medo, enfrentaram a doença e a morte, porque a sua fé ficou fortalecida e inabalável pela manifestação do Divino.

O medo não é próprio daquele que sabe que «É o Senhor!» (Jo 21,7). De facto, Deus apenas nos pede que tenhamos fé, para poder operar prodígios e maravilhas na nossa vida: «A tua fé te salvou!» (Mt 9,22) pois, a quem tem fé, tudo é possível (Cf. Mc11, 23-24).

A pequena pastorinha Lúcia cresceu e tornou-se numa mulher de fé, mulher destemida e audaz, capaz de grandes coisas por Deus, ao jeito de Teresa de Ávila, a quem seguiu os passos na sua consagração a Deus. No seu livro «Apelos da Mensagem de Fátima», deixou escrito: «É a luz da fé que guia os nossos passos, conduzindo-os pela via estreita que leva ao Céu. É pela fé que vemos Cristo nos nossos Irmãos, que os amamos, servimos e ajudamos, quando precisam do nosso auxílio. É ainda pela fé que nos vem a certeza da presença de Deus em nós; de que estamos sempre sob o olhar de Deus».

Tal como Santa Teresa, a Irmã Lúcia sabia como Deus trata os Seus amigos, pelo que encarava o sofrimento como uma forma de Lhe provar o seu amor, visto que só quem não ama é que não sofre. O seu jeito de vencer o medo em cada circunstância que a vida lhe apresentou passava pela sua «determinada determinação» (CP 21,2), como diria S. Teresa de Jesus, sem nunca se deixar derrubar, desanimar ou desistir de fazer aquilo que ela sabia ser a vontade de Deus.

Ao longo da vida, a Irmã Lúcia teve inúmeras ocasiões para provar a sua fé e a sua confiança inabaláveis em Deus. A sua vida de mensageira e confidente de Nossa Senhora não foi fácil; muitas foram as dificuldades e os problemas que teve que enfrentar, mas ela sabia que, acontecesse o que acontecesse, Deus agiria no tempo certo, pois Ele protege e cuida daqueles que ama e que O amam.

Hoje, como em muitas épocas da história da humanidade, estamos a viver tempos de incerteza, atravessamos uma pandemia e temos o mundo em guerra, os problemas familiares, sociais e profissionais são uma constante na nossa vida e o medo assalta-nos, mas não devemos perder a fé e a confiança em Deus, pois também hoje as palavras de Jesus são para nós: «Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma. Temei antes aquele que pode fazer perecer na Geena o corpo e a alma. Não se vendem dois pássaros por uma pequena moeda? E nem um deles cairá por terra sem o consentimento do vosso Pai. Quanto a vós, até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados! Não temais, pois valeis muito mais do que muitos pássaros» (Mt 10,28).

Se não vencermos os nossos medos, dificilmente seremos verdadeiramente discípulos de Cristo.

Ir. Ana Sofia de Maria e da Trindade

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