Em profunda devoção ao Sagrado Coração de Jesus, Teresinha decidiu entregar-se ao seu Amor Misericordioso como uma «oferta», uma «vítima», num compromisso total da sua pessoa.
Com ardor, suplicou ser «consumida» pelo fogo do Amor Misericordioso. Compreendera ela que o dom de si mesma é, antes de mais, fruto duma ação gratuita de Deus que vem preenchê-la. Amar é estender e abrir as mãos, recebendo tudo, e receber-se a si mesma, da Misericórdia, à qual nos abrimos e à qual nos oferecemos. Isso levá-la-á a escrever num seu poema bem conhecido: «amar é tudo dar e dar-se a si mesmo».
Assim se oferece Teresa como Vítima de Holocausto ao Amor Misericordioso: «ó meu Jesus, que seja eu essa feliz vítima; consumai o Vosso holocausto pelo fogo do Vosso Divino Amor!».
A palavra «holocausto» evoca a imagem do fogo que consome, pois bem deseja ela ser consumida pelo Fogo do Pentecostes, esse fogo espiritual do Amor Divino…
Teresinha realizou o seu Acto de Oferecimento ao Amor Misericordioso no dia 11 de junho de 1895 – tão só dois anos e quatro meses antes de morrer muito jovem. Ajoelhada aos pés da imagem da Virgem do Sorriso, tendo a seu lado sua irmã Celina, pronunciou as seguintes palavras: «ó meu Deus, Trindade Bem-Aventurada, desejo amar-Vos e fazer-Vos amar…».
Inundada por este rio de graça, Teresinha reconheceu não ter realizado este Acto de Oferecimento apenas aquela vez, como se fora para sempre, mas que devia renová-lo continuamente; e prosseguiu: «Quero, ó meu Bem-Amado, a cada batida do meu coração, renovar-Vos esta oferta um número infinito de vezes, até que, dissipadas as sombras, Vos possa dizer o meu amor num face a face eterno».
A doutrina espiritual de Santa Teresa do Menino Jesus, no que diz respeito à devoção ao Sagrado Coração de Jesus, parece aproximar-se à doutrina de Santa Margarida Maria Alacoque; e não restam dúvidas que a devoção ao Coração de Jesus da Bem-aventurada Maria Droste é gémea de ambas; aliás, por coincidência, a Bem-aventurada tomou hábito no dia de Santa Teresinha! E foi ainda por direta intervenção da Irmã Maria do Divino Coração – Maria Droste – que o Papa Leão XIII consagrou toda a Humanidade ao Sagrado Coração de Jesus.
Registemos, contudo, que Teresa de do Menino Jesus expressou certas reservas em relação à devoção ao Sagrado Coração de Jesus, tal como era praticada na sua época. Rejeita ela, por exemplo, a abordagem excessivamente dolorista da referida devoção, tal como era prática em finais do século XIX – marcada, sobretudo, por imagens sangrentas, insuportáveis para a sua extrema sensibilidade. Numa carta enviada a sua irmã Celina, presente em Paray-le-Monial, por ocasião do segundo centenário da morte de Margarida Maria, Teresinha escreve com a sua habitual, mas bem pensada, espontaneidade: «reza bem ao Sagrado Coração. Sabes, eu não vejo o Sagrado Coração como toda a gente».
E acrescenta: «não te esqueças da Teresa que ficou lá, murmura apenas o seu nome e Jesus compreenderá. Tantas graças estão ligadas a esse lugar, sobretudo para um coração que sofre».
Certas formas de devoção parecem-lhe, de facto, carecer de interioridade: «penso que o Coração do meu Esposo me pertence a mim só, tal como o meu coração lhe pertence só a Ele. Falo-Lhe então na solidão desse delicioso coração a coração, enquanto aguardo o dia em que O contemplarei face a face».
A jovem carmelita deseja, enfiam, perder-se amorosamente no Coração de Jesus, assim como deseja esconder-se no segredo da Sua Face. Não se deve esquecer que o ponto comum entre a devoção à Santa Face e à do Sagrado Coração de Jesus é precisamente a reparação. Para Teresa, o Coração de Jesus é, já nesta terra, um purgatório, onde ela pode, como escreve, «reparar as suas faltas lançando-as na fornalha do Seu Amor Misericordioso».
Lembra-nos isto uma das visões de Santa Margarida Maria, não é verdade?
Teresinha traz, pois, à corrente reparadora, e assim ao mistério do Coração de Jesus, uma espiritualidade centrada no mistério da consolação a oferecer a Jesus. Como? Consolando o Seu Coração, saciando a Sua sede de Amor, devolvendo-Lhe «Amor por Amor».
Já em julho de 1887, Teresinha (então, menina de apenas 14 anos) experimentara esta sede que devora Jesus. Referindo-se ao encontro de Cristo com a Samaritana, escreveu: «ao dizer Dá-me de beber era o amor da Sua pobre criatura que o Criador do universo reclamava. Ele tinha sede de amor – Ah! Sinto mais do que nunca que Jesus está sedento, e só encontra ingratos».
Através do seu próprio caminho espiritual, Teresinha fez – à luz da misericórdia de Deus – uma reinterpretação da devoção ao Sagrado Sagrado Coração, indo ao essencial da mensagem de Amor aí contida. Ao colocar em destaque o Oferecimento ao Amor Misericordioso, ela contribuiu (e continua a contribuir) neste séc. XXI, para libertar a mensagem de Paray-le-Monial dum certo clima dolorista, herança do jansenismo, cujas influências negativas ainda hoje sentimos e – não sei se estarei a exagerar – parece que, ali e acolá, ressurgem revigoradas.
De reparar, que o seu «pequeno caminho de infância espiritual» foi uma verdadeira revolução espiritual, recordando-nos a todos o coração do Evangelho: Deus está pronto a derramar em nós as torrentes da Sua Misericórdia, na medida em que tomamos consciência da nossa própria miséria!
Aliás, em seus dias, afirmou o Papa São João Paulo II que Santa Teresinha «compreendeu de forma admirável o anúncio comovente do Amor de Deus, recebido como dom e vivido com a humilde, confiança e simplicidade dos pequenos, que em Jesus Cristo se confiam totalmente ao Pai».
Teresinha, Margarida e Maria Droste, rogai por nós, e confiai-nos a nós e às nossas famílias ao Amor Misericordioso, e ajudai-nos a consolar o coração de Jesus com a dedicação inteira das nossas vidas!
Amen.