Quando nos encontramos numa situação de doença, em que nos deparamos com a nossa fragilidade humana, temos necessidade de acreditar em algo que nos ajude a ultrapassar essa fase. Para muitos, essa crença deposita-se na ciência, no cumprimento das indicações do profissional de saúde, das horas da toma dos medicamentos e, embora mais difícil, até na mudança de pequenos hábitos de vida que nos sejam recomendadas. Para outros, a ciência não é suficiente, pelo que se agarram à fé que defendem, pedindo a intercessão de Deus, de Nossa Senhora ou dos Santos na resolução da sua doença.
Numa primeira vista, parece que a ciência não precisa da religião para resolver as questões de saúde, pois ela tem as armas todas de que necessita, e a fé não surge como uma delas. Apesar de estarem documentados inúmeros casos de pacientes que conseguiram recuperar de condições graves, desafiando prognósticos reservados, continua a existir um certo ceticismo na comunidade científica em relação ao papel da fé na recuperação de saúde. Muitos cientistas preferem atribuir essas recuperações a fatores como a resiliência psicológica, o apoio social e a adesão rigorosa aos tratamentos médicos. No entanto, são cada vez mais as situações onde a ciência é surpreendida pela força e o poder da fé dos seus doentes.
Um exemplo é o de Paul Wood, um homem a quem foi diagnosticado um cancro no cérebro em 2018 e que, no dia anterior à data da sua cirurgia, o cancro tinha desaparecido completamente sem qualquer tratamento. Outro exemplo é o de D’Zhana Simmons, que viveu 118 dias sem um coração, graças a um coração artificial, até que um novo transplante fosse realizado. Também podemos lembrar o caso de Dafne Gutierrez que, em 2003, foi diagnosticada com uma forma rara e agressiva de leucemia e que, após uma visita inesperada do Papa João Paulo II e contínuas orações fervorosas, experimentou uma remissão completa e inesperada da sua doença.
De facto, a ciência já começa a debruçar-se sobre o impacto da fé na recuperação de doentes, havendo estudos que mostram que esta pode desempenhar um papel fundamental na saúde. A prática religiosa está associada à secreção de endorfina e dopamina, substâncias químicas que atuam a nível do cérebro e promovem o prazer e o bem-estar. Além disso, a fé pode proporcionar esperança e resiliência, fatores que são cruciais para a recuperação de doenças graves.
A Igreja Católica tem uma longa tradição de reconhecer o impacto positivo da fé na recuperação da saúde. O Papa Francisco, em várias ocasiões, destacou a importância da oração e da fé na recuperação. Em 2010, numa Audiência Geral, afirmou que «somos seres frágeis, mas sabemos rezar: essa é a nossa maior dignidade, é também a nossa força. Coragem. Rezar a todo momento, em toda situação, porque o Senhor está perto de nós. E quando uma oração está de acordo com o coração de Jesus, ela obtém milagres». O Papa Bento XVI também enfatizou a relação entre fé e saúde, num discurso aos participantes da Assembleia Plenária do Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde em 2007, onde afirmou que «a saúde do homem, do homem todo, foi o sinal que Cristo escolheu previamente para manifestar a proximidade de Deus, o seu amor misericordioso que purifica o espírito, a alma e o corpo». São João Paulo II, conhecido por sua profunda espiritualidade, abordou a questão da fé na recuperação de saúde em várias ocasiões, nomeadamente num discurso aos participantes do XIX Congresso Internacional do Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde em 2004, onde afirmou «quem se abre, na fé, a esta luz, encontra conforto no próprio sofrimento e adquire a capacidade de aliviar o sofrimento do próximo».
Recentemente, o Papa Francisco foi diagnosticado com uma infeção das vias respiratórias, uma pneumonia bilateral (que afeta ambos os pulmões), uma condição complexa que exigiu sua internação no Hospital Gemelli, em Roma. Aos 88 anos, o Papa enfrenta desafios significativos devido à sua idade avançada e ao histórico de problemas pulmonares. Apesar da gravidade da situação, o Papa Francisco tem demonstrado uma notável resiliência e fé. Ele continua a manter uma agenda de compromissos, mesmo durante o internamento, e tem recebido inúmeras mensagens de apoio e orações de fiéis ao redor do mundo. Num texto seu, de 2 de março de 2025, relativo ao Angelus desse dia, o Papa afirmou sentir «todo o vosso carinho e a vossa proximidade e, neste momento particular, sinto-me como se fosse ‘carregado’ e apoiado por todo o Povo de Deus. Obrigado a todos!». Acrescentou ainda que dá «graças a Deus» pela «oportunidade de partilhar no corpo ou no espírito a condição de tantas pessoas doentes e sofredoras».
A fé tem desempenhado um papel crucial, não só na luta pela recuperação física do Papa Francisco, mas também na aceitação da vontade divina. Ele tem sido um exemplo de como a fé pode proporcionar conforto e força em momentos de adversidade. A combinação de cuidados médicos avançados e uma fé inabalável tem sido fundamental para sua recuperação.
Continuemos, neste tempo, a rezar pelo Papa Francisco, para o Senhor o proteja e acompanhe nesta fase, e para que o Papa possa recuperar a sua saúde e continuar a sua missão de ser sucessor de São Pedro nos dias de hoje, apoiado na ciência humana que quer tratar e curar todos os doentes. Mas que se faça a Sua vontade, acima de tudo.
Textos citados:
Papa João Paulo II; Discurso do Papa João Paulo II aos participantes no XIX Congresso Internacional do Pontifício Conselho para a Pastoral no campo da Saúde; https://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/speeches/2004/november/documents/hf_jp-ii_spe_20041112_pc-hlthwork.html, acedido a 1 de março de 2025
Papa Bento XVI, Discurso do Papa Bento XVI aos participantes na Assembleia Plenária do Pontifício Conselho para a Pastoral no campo da Saúde; https://www.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/speeches/2007/march/documents/hf_ben-xvi_spe_20070322_pc-salute.html; acedido a 1 de março de 2025
Papa Francisco, Audiência Geral; https://www.vatican.va/content/francesco/pt/audiences/2021/documents/papa-francesco_20210210_udienza-generale.html; acedido a 1 de março de 2025
Diário de Notícias/Agência Lusa; Após “noite tranquila”, Papa diz sentir “bênção que esconde a fragilidade” e agradece a médicos e fiéis; https://www.dn.pt/internacional/papa-francisco-passou-uma-noite-tranquila-vaticano; acedido a 5 de março de 2025